Hoje eu sou vai e vem, sou vento, sou bater de asas. Não sou mais um corpo cansado e moreno esperando socorro.
Eu aí e você cá... Talvez seja assim.
Perdão ao leitor que leu e não gostou.
Não gostou de entender, compreende.
Não deleitou a possibilidade de criar.
Gritou: Ora! É tu, nobre, o autor...
Perdão ao mau entendedor de versos.
Que passou a profanar minh’alma,
Por não mais escapar das armadilhas.
Armadilhas obstinadas ao entender.
Perdão ao sonhador que se viu preso.
Preso em proposta de liberdade, livre.
Inquinado pelos sons do poema.
Sonhou ateu, sonhou plebeu...
Perdão às musas que não inspiraram.
Passaram cegas por meus olhos, assim.
Alvas demais, puras de vontade, pobres.
Sem cortes, sem versos. Ninfas egípcias.
Perdão aos sentimentos ocultos, sóbrios.
Que apenas em entrelinhas vivem, rainhas.
Comeram acentuadas dispersões do leitor,
Culpa do poeta que claro som não versa.
Perdão ao universo incorreto que consome.
Consome tudo que mistifico em almas...
Crio outros lugares, outros perdões,
Outros fins, como esse que se compõe.
By Camila Passatuto
Permaneço imparcial,
Mas o que são parcelas?
O cartão venceu
Nas contas exatas.
O telefone toca,
Mais uma
Cobrança.
Exigência nossa.
Permaneço imparcial.
Os passos longos.
O corpo se movendo,
Cálido.
No chão mais um menino.
Permaneço espacial, olho.
Moedas, moelas... Tanto faz.
Ofereço de carinho breve.
Voltei para casa.
Juntei alguma riqueza,
Paguei as parcelas.
Mas falta o amor em minha mesa.
Acordo atordoado
Atrasei, acordei.
O mundo cinza
Exige polidez.
Hora do trabalho
Do que vale meu centavo?
Permaneço mais escravo.
Moedas, moelas... Escasso.
No chão mais um menino
Permaneço mais cansado
Ofereço de carinho breve
A rotina de vassalo.
Em casa o banho quente,
Masturbação não contente.
As contas, ponta de lápis,
Dias sem te ver, fico exigente.
O cartão venceu
Nas contas exatas.
No natal mando outro
Vai ler quando durmo nas escadas.
Da sacada de princesa
O ouro de mendigo
A realidade desse pobre
É cada verso que aqui digo.
Sem dinheiro, sem sonhos.
A fortuna é rasa,
Forma limites...
Expulsou-me de casa.
Permaneço louco vadio,
Na porta de algum banco,
Deitado em tímido canto.
Quando passa, peço um mango.
Olha sem jeito, reconhece tal sujeito.
Os lábios são os mesmos, desejos.
Moeda é o que joga no chão, agradeço.
Oferece de valor breve o que um dia não tinha preço.
By Camila Passatuto
Caminhou tão depressa que fez do caminho longo algo banal para o relógio. Estava na hora, não sabia ao certo que hora era aquela que por entre mistérios revelados escondia sua importância. Não sabia de nada, dos motivos que o moviam, das trapaças que com delicadeza sem sentir tropeçava. Que sem sentir... Amarrava.
Era um dia qualquer, com um compromisso qualquer. Abriu a porta de madeira que rangia feito uma fêmea mal devorada, sentou no sofá pouco confortável e tratou de banhar o ambiente com seu despretensioso olhar. Nada viu. Nada que o levasse ao delírio da transcendência infantil de tempos atrás.
Chega à sala quem um dia foi imã. Saia justa, uma camisa social quadriculada e os pés abraçados por um par de pares distintos de meia.
Ele a fitou discretamente, olhou como quem reprovasse aquela beleza molambenta, aquele cabelo longo e negro, aquela atmosfera de inocência ninfomaníaca em que ela sempre o envolvia. Ele, em um suspiro sem carisma, esnobou aquela breve criatura, tão breve que vivia em alta freqüência em seus pensamentos, que passava o dia todo pulando nas lembranças.
Ela carinhosamente despercebeu o esforço que ele fazia para manter no chão todos os sentimentos sórdidos, hoje chamados assim, tempos antes eram sonhos.
Ele percebeu que as horas eram desiguais para ambos.
Para ele aquele momento era o único segundo após o fim. Fim de anos, fim de intermináveis meses, fim de dias sem ela. O fim dos sonhos. Do sonho de ser dois, um, tudo, nada...
Para ela aquele momento era mais um segundo que pedia outros segundos, esse tempo que ainda falta. Tempo de espera, tempo de apostas infundadas, impensadas...
Dos desejos mal ditos, eram-se.
Ela nada tinha para falar. E ele pensava que ia escutar...uma palavra qualquer, um aviso implicante, um estilo de rompimento verbalizado e oficial.
Ela nada tinha em palavras.
Ele desejava.
Ela era seu imã, não importava a situação. Não importava o que se tornavam a cada tristeza ou esquecimento.
No ato mais solitário ele rompeu o silêncio. Rugiu o ambiente quando levantou do sofá. Ela estremeceu, pois tudo estaria prestes a acontecer. Tudo, Tudo que nem imaginava o quê.
Ele sabia que não agüentaria mais uma de suas meninices, as provocações e acusações sem nexos e arreios.
Resolveu tomar a atitude. Certas atitudes queimam. Mas estava disposto a incendiar, e quem ou o quê fosse frágil, iria virar cinza, cinza.
Ela estava disposta a gelar. O estomago já soprava os ventos nórdicos.
Ela, apenas, queria uma brisa que não ferisse a paisagem intocada do passado que, sem ele saber, ela o guardara intacto in memorian e no corpo e no quarto e na cama e nos versos que para ela eram dedicados e recitados por seus lábios toda noite, toda saudade, toda insanidade.
O ambiente daquele apartamento era de uma urbanização alarmante. Dois transeuntes prontos para se atropelarem. Uma placa de trânsito, roubada pelos dois nos tempos de amoras enlatadas, exposta um tanto torta na parede de textura um tanto grunge, é que assistia aquele quase engarrafamento de nada, de tudo.
Ele com a mão direita no bolso e a esquerda coçando a barba, parecia o mais centrado dos dois. Ela com a perna direita em cima do sofá, o corpo inclinado para ele de modo tímido e quase invisível, as mãos soltas, os seios firmes e algo mais a fazia ter um caráter despojado e dominador.
Mas qual dos dois iria ceder aos centímetros?
O medo de ambos de se machucarem. O medo do: não alheio, isso era contrastante, junto com a certeza da necessidade das infantis almas postas mais um vez em caminho comum.
Ela esperava o momento certo dele.
Ele esperava a certeza dela.
Eternamente o medo.
Eternamente aquele instante que não sabiam de nada, dos motivos que os moviam até aquilo, das trapaças do destino que com delicadeza sem sentir tropeçavam.
Que sem sentir se amarravam...
Qual dos dois?
Mas qual dos dois iria ceder aos centímetros?
Ele queria sonho, fechou os olhos.
Ela queria sonho, percebeu a recíproca antecipada daquele cara, que sempre antecipava, ejaculava nas preliminares, adivinhava suas dores e desejos, chegava em primeiro lugar em sua alma, até mesmo quando atrasava.
Eles queriam sonhar.
Eles queriam terminar aquele ato indeciso de desconhecidos... na cama, no café da manhã, na caricia após um murmuro, no torcer de nariz, nas brigas, no altar, nos filhos, nos problemas, no amor, nos problemas, em mais amor, na velhice, no cansaço, no orgulho, na felicidade, nas brigas, nos gozos, nos acidentes, nas sortes, na vida, na doação de suas mortes...
Mas ela esperava o momento certo dele.
E ele esperava a certeza dela...
Em meio aos bosques, procuro e não sei por onde anda a doce felicidade. Em mim, o que move, remove e comove quem vê, é apenas um vento frio que ocupa meu ser em dias constantes de penar.
O sorriso que trago, no estreito rosto, é singelo mistério, ninguém percebe...
E por entre apostas majestosas o meu corpo se lança, o riso sai fácil, a bebida entra lenta e amarga como a velocidade que me esquenta. Tudo tão irreal.
Nunca fingi tão bem.
Depois que partiste me tornei algo ruim, ruim para mim, ruim para a minha sóbria verdade; hoje sou de gosto peculiar para quem deseja provar e cuspir, e redimir em si a vontade do que é bom.
Nada está bem aqui. Não queria que soubesse disso. Não queria que imaginasse a minha dor, pois se imaginar corretamente vai sofrer parte do que sofro.
Sofrimento seu aumenta o meu. Desfaz o querer saber em ti.
Em meus aposentos, no meio da gélida madrugada, que conforta os sentimentos dos espectros amigos, esses que percorrem minha mente, meu corpo, minha sanidade doente, minha luxuria fétida, meu humilde presente caído em forças de si... É onde o sono tem medo e foge, é quando olho para dentro e vejo ruínas, lavas borbulhando, seres clamando por compaixão, lágrimas que em contato com o magma faz rocha em meu chão.
Sou isso, louco monstro da torre em transmutação, sem rumo e não só perdido, mas sim desviado a cada insensato torpor de tristeza.
É uma perda constante, sou eu navegante...
Não sei se imploro ajuda, não sei de nada...
Comigo, o sentido do futuro, não anda mais... É minha farsa tentando me convencer, é meu sujo orgulho tentando, de mim, tudo esconder.
Construí esse castelo de proporções amigáveis e com bases sólidas. O governo, que aqui regia, era sincero, com soldados armados de fidelidade e coragem.
Eu ainda possuo o meu reino, os papéis, as dívidas, as guerras... Eu ainda tenho tudo, ainda administro a província abandonada.
Eu ainda sou rei. Ainda decreto amor por aí. Eu ainda não percebi que o conto feliz da Idade Média não é mais aqui...
By Camila Passatuto
Por menos que eu pense, é sempre mais.
Por mais que você fuja, é sempre menos;
Menos espaço entre as tais almas, mortais.
Por mim e por nós, nada embaça, alivia...
Meninos que almejam um troco, esquina.
Velhos que se bebem
Tudo plenamente certo, no errado, é vida.
Respiro essa angústia somente por mim...
É vida que não cala o meu horror a tudo,
Por você e seus dejeitos de ancorar, sim.
Em mim se fez cicatriz, fui porto, fui sim.
Por mim e por nós, quem dispara emoção?
Senhores de cartolas bem postas na cabeça,
Senhoras em vestidos cúmplices de nobreza.
Suspiro a maldição que vem em brisa, ria.
E tudo plenamente certo, no errado de
nossas vidas.
By Camila Passatuto
Andei pelas ruas
Já descrevendo,
Já escondendo,
Ouvi histórias.
Velhos sorrindo.
Novos, não mais,
Sabe-se lá como,
Reagindo.
Um enredo falso
Cantarolei aqui.
O sol quente
E Cartola, sorri.
Andei mais ali
Entrei em igreja
Sai feliz de bar
Senti certeza.
E de vida vazia
Não morrerei.
Ando triste,
Mas ando, sou rei.
Roça, mar, deserto,
Cidade...
Com ou sem amor
Por perto.
Andarei longe
Sem futuro
Sem medo,
No escuro...
Procurando
Sem achar
Palavra,
Verbo. Amar.
Andarei com você
No pensamento,
No livreto...
Ah! Livramento.
Pelas ruas, ando,
Conheço o sofrer...
Felicidade aqui
Por poder, isso, escrever...
By Camila Passatuto
Vou ser simples em meus versos,
Vou ser o que estou... Verso triste.
Um pedaço de saudade, verso livre.
Um imenso de amor, verso, verso...
Tanta coisa para falar,
Mas quer silêncio.
Sou de som,
Sou de falar quando estou triste.
E o verso fica descabido no poema
Fica feio
Fica como estou
Jogado e assustado.
Não tem rima, não.
É simplicidade de poema.
Não tem forma.
É conteúdo triste de poeta.
Ah! Eu devo gritar por você,
Pedir aos deuses algum licor.
Clamar o quê? Nada mais de dor?
Fica feio...
Vou caminhando em versos simples
Sem métrica
Sem nada de pensar
É só sentimento... É amar.
Fica feio,
Devo por arreio nisso tudo.
Mas talvez depois...
Quando isso em mim se for.
E se o verso fica descabido,
O que cabe a mim?
Digo que sofro?
Mas fica feio...
Chama poeta de chorador
Inventor de palavras
Dramático velho
Desajeitado sonhador.
E assim vou
Triste, desbravador e assumido
E assim fico
Feio, meio ao meio... Esperando abrigo.
By Camila Passatuto