Biografia da Autora

Camila Passatuto nasceu em 1988, na cidade de São Paulo. Autora dos livros "Nequice: Lapso na Função Supressora" (Editora Penalux, 2018) e "TW: Para ler com a cabeça entre o poste e a calçada" (Editora Penalux, 2017).

Editora do projeto editorial O Último Leitor Morreu (conheça o projeto e as publicações). Escreve desde os 11 anos e começou a atuar nos meios digitais, com blogs de poesias e participações em diversas revistas e projetos literários, em 2007.

Contato: camila.passatuto@gmail.com


sábado, 19 de setembro de 2009

Tanto

O corpo não mais suportava o tanto de alma que ali estava, precisava se emanar, se dissipar de liberdade. Uma liberdade de comprometimento e soltura. Ali a angústia dominava o engatinhar depressivo de seus pensamentos, andava sem os pés e pensava sem a consciência, o que guiava era apenas um querer estranho, misterioso e certo de ações.
O corpo não suportava tanto mar, olhares que de acolhedor só tinham o piscar e o fechar de indiferença. Passos, braços e correu para longe. Deixou e se foi, foi e se deixou um pouco, era preciso encontrar a barreira que do chão não visualizava, quis subir o mais alto possível, queria escalar até perder o que restava de ar e vida.
Os movimentos eram mais que estáticos, apenas o coletivo que o acompanhava é que o fazia parecer móvel, o olhar não cessava e a respiração escassa era o que de mais romântico estava presente, era o que fazia a tristeza algo mais que belo, mais que grego, mas um tanto parisiense.
Subiu, olhou...encontrou muros por todos os cantos daquele mundo em que se incutia mais e mais, observou buracos entre os seres, buracos de desconhecimento, de medo e injustiças. Conseguiu encontrar ouro sobre as cabeças de algumas pessoas que corriam perdidas para direções diferentes, talvez sejam esses os verdadeiros chefes, os verdadeiros mestres, mas estão perdidos, incompreendidos e perseguidos por leis que os julgam como loucos modernos, descontentes prazerosos e construtivistas complexos...seriam esses os verdadeiros donos da tão procurada razão? Não sabia responder, o corpo estava prestes a cair da imensidão, não suportava mais tanto ar...e o que suportaria? Abriu o peito e por um instante precisou comer-se de literatura, foi poeta pela última vez. Se jolgou, caindo e percebendo o tanto de oportunidades, o tanto de liberdade que sempre teve e que de tantos ques se perdeu entre entrelinhas, poemas antigos e manuscritos eternos.
Não restava mais nada, além do que contemplar o cair de corpo, o amar de segundos e a certeza de tanto.




By Camila Passatuto

domingo, 13 de setembro de 2009

Correspondência Poética


Caro Amigo,
Percebi que minhas palavras perderam o foco e se deixaram guiar pela bagunça. A arte me esgotou e agora o que tenho a oferecer são apenas fragmentos salgados e pontes de ponta cabeça.
Hoje me coloquei em frente ao espelho, notei as paralelas nascendo em minha fonte, em instantes o rosto estava molhado, a maquiagem saia, junto com ela toda a inspiração. Ainda com a face úmida, corri para a sala e me estirei no tapete feito um gato gordo e velho que só espera por mais um afago do tolo dono.
Percebi que não se pode ser poeta todos os dias, não se pode ser ator em todas as cenas, não se pode pintar o céu com a tinta azul...
Ao levantar reparei no telefone, talvez uma ligação acabaria com o tédio e nasceria ali a decepção para criar uma obra prima. Um passo adiante e a porta estaria aberta, não ousaria sair, pois ao sentir o sol da manhã a morbidez necessária sumiria.
Caro amigo, o ridículo da palavra me assusta, hoje o silêncio completa o papel, a lapiseira se tornou instrumento obsoleto para o que sinto, sinto...sinto que já foi dito tudo, as metáforas me tão ânsia, o estilismo virou modismo, ismo em esmo...
Amigo, espero que ainda sobre paciência em sua alma para aturar minha decadência poética...
O nulo me consome,
Repetições feitas.
Minha fuga ali,
...correspondência .
By Camila Passatuto
05/03/08

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Conto de criança n°1


A tarde toda brincando, o sol vai se escondendo e perdendo a sua força, mas parece que nós crianças vamos ganhando uma energia que vai e se multiplica com o passar das horas. Sempre a esse horário tem gente voltando da escola. Ah! Escola. Eu acho engraçado o pessoal mais velho da escola, eles são diferentes da gente. Nós não andamos em bando, apenas brincamos com todo mundo, fazemos amigos com facilidade, um pega-pega e uma brincadeira de esconder e pronto, amanhã nossa turma muda ou entra mais gente, é um eterno renovar.
Nesse brincar as pessoas acham que não, mas, fico reparando as pessoas que passam pela rua. Olham a gente, acham engraçado, uns velhacos reclamam do barulho, os bêbados até querem entrar na brincadeira, mas temos medo e fugimos para o outro lado da rua.
Nesse meu reparar de pessoas um dia me surpreendi, se surpreender é que nem se engasgar com calda de pêssego, a gente se assusta, mas é gostoso. Mas voltando ao meu surpreender... Minha surpresa foi uma moça que mora aqui por perto, nunca havia visto uma pessoa tão diferente, diferente do modo bom. Ela anda com os pensamentos altos, tão altos que eu penso que posso ouvir. Corro para o seu lado e pergunto seu nome, com um olhar que mistura desprezo e carinho, ela responde: Monick. Monick poderia ser minha nova amiga, poderia brincar com a gente, ser mais uma no meu renovar de turma. Mas a Monick já é grande, grande como um dia eu vou ser, ela é misteriosa e tem o olhar mais misterioso que eu já vi. Ela nunca conversa muito quando eu a vejo passando por aqui, talvez seja tímida, tímida como eu sou quando mamãe me manda dar beijo nas visitas. Será que sou que nem visita pra Monick? Bom, a Monick é grande, mas pra mim só é grande de tamanho, ela é criança feliz, eu sei. Mas criança não usa brinco na boca e nem tem desenhos pelo corpo... A Monick tem tudo isso, todo mundo fala que é moderno, eu só acho muito bonito o modo como aquele piercing, como é chamado o tal brinco, brilha e faz com que eu não entenda como alguém consegue comer com aquilo, vovó sempre diz que gente do mal que usa isso, mas a minha amiga Monick não é do mal, ela só usa brinco na boca e eu acho muito bonito.
A minha amiga Monick, eu acho que ela é minha amiga eu gosto muito dela e amigos sempre se gostam... Não sei se ela gosta de mim, mas toda vez que estou na rua e a vejo chegando da escola eu corro pro lado dela, dou um grande abraço e falo para meu amigos: gente essa é a Monick. Ela fica vermelha de vergonha e parece não entender minha reação... Ah! Mas eu só quero que ela entre para a minha turma, para o meu eterno renovar de turma.

By Camila Passatuto