Biografia da Autora

Camila Passatuto nasceu em 1988, na cidade de São Paulo. Autora dos livros "Nequice: Lapso na Função Supressora" (Editora Penalux, 2018) e "TW: Para ler com a cabeça entre o poste e a calçada" (Editora Penalux, 2017).

Editora do projeto editorial O Último Leitor Morreu (conheça o projeto e as publicações). Escreve desde os 11 anos e começou a atuar nos meios digitais, com blogs de poesias e participações em diversas revistas e projetos literários, em 2007.

Contato: camila.passatuto@gmail.com


domingo, 21 de setembro de 2008

Mais uma de Saudade (Parte I)

Guiando o carro, com um medo infantil, olhava sem parar para os retrovisores, as gotas de chuva e o cinza daquela meia tarde me faziam tremer...Sóbria demais para tal façanha, mas ali estava, sozinha em uma pequena estrada, a compra no porta-mala, o troco no porta-luva e meu coração no seu porta-corações.
No rádio tocava Djavan “ .. te adoro em tudo, tudo, tudo...”, aumentei timidamente o volume e senti as gotas de chuva percutirem em harmonia com a canção. As luzes dos postes começavam a enfeitar minha despojada cena solitária que ia se desenrolando com uma certa cumplicidade, entre os elementos oferecidos ali e minha intensa saudade.
Se pudesse fecharia os olhos para imaginar seu rosto, mas isso não era necessário porque ela se materializava ali no banco do passageiro, em um subido espasmo quase desviei a direção do carro, mas me contive...não poderia imaginar, ela estava ao meu lado, minha mente a trouxera para mim, e o que fazer?
Mantive a calma, a chuva insistia em cair alegremente, zombando da minha situação.Perguntava-me a todo instante se aquilo não seria um fantasma que viera me buscar, pois sou dessas que provavelmente aos 27 não existirá mais no mundo, mas fantasma nenhum teria uma presença tão angelical como aquela...
Inclinei rosto para o lado e lá estava a minha garota a sorrir, com timidez nos lábios, sua pele branca desmentia qualquer repúdio de não-virgindade, os olhos magicamente me chamavam para mais perto e no tom mais apropriado ela me disse: “Amor, porque o susto? Não gostou de me ver?”. Ao ouvir aquelas palavras que soavam em um sotaque tentador e em uma delicadeza medieval, não pude conter um breve sorrir de alma e ela, como se conhecesse o ponto mais intimo de minha alma, sorriu com os olhos cheios de carinho.
Eu não mais guiava carro algum, não sentia a iluminação da cidade, não ouvia a chuva e desconhecia a existência de Djavan, Caetano e qualquer outro mané.
A única coisa que me passava pela cabeça era encostar o carro e poder entender tudo aquilo com um abraço. O coração acelerado, a respiração, que antes era inexistente, agora era intensa.
Estacionei o carro em uma rua qualquer, pude sentir seus olhos percorrerem o meu corpo e depois se fixarem em meus lábios. Eu queria só saber o que passava por sua mente, queria saber como poderia estar ali ao meu lado, tão possível, tão visível, tão linda e real.
Olhei em seus olhos e respondi à sua esquecida pergunta: “O meu susto é infantil e te ver é o que meus olhos mais desejam fazer quando sua imagem persiste em fugir”. Sem eu perceber ela se encostou em minha roupas, acariciou meu pescoço, percorreu seus dedos pelos meus lábios e rosto, sem pedir permissão desfez a distância entre nós com um delicado toque de bocas, que aos poucos se transformou em um beijo cheio de vontade, cheio de carinho e saudade. Pude sentir a textura indecifrável de sua língua deslizando, dançando sensualmente dentro da minha boca, a menina que me namorava, a menina que ali estava de sigla M.D. me mostrou um desejo antes desconhecido por minha pele. Assustei-me com o turbilhão de sentimentos e rompi com a farra das línguas, ela se agarrava em minhas pernas, pude sentir seus seios nos meus e a respiração da minha garota fazia suar meu rosto. Como se nossa ilha fosse aquele carro , como se minha saudade fosse a fonte das realizações, como se eu ainda não houvesse tido mais ninguém em minha vida, eu estava ali feito um filhote e aquela mulher seria a que me ensinaria a voar, a dar os primeiros passos, a ter o seu corpo pela primeira vez. Ela me conduzia com o olhar e num instante preciso disse: “ me ama?”, respondi sinceramente: “mais que tudo nessa vida, mais que minha própria vida, te amo e minha alma suplica e diz que preciso de você o quanto antes”, ela ainda se agarrava em minhas pernas, suas mãos estavam firmes, sua boca ainda estava a uma incrível distância inexistente que permitia nossa conversa, meu rosto ainda suava com sua respiração.
Olhou-me e mais uma vez e para alegria de meus ouvidos começou a falar: “Tenho que ir, ainda não é hora, mas saiba que estou sempre a te amar, te amo e isso é a única certeza que tenho, a saudade é grande, mas não maior que o meu amor por você, estou aqui para te mostrar que nunca te deixarei, te amo e você é quem eu quero para sempre ao meu lado”. Sem pensar no que falar, respondi: “ Se soubesse o quanto te amo, não partiria agora, ficaria comigo, fugiríamos...eu te amo, a cada segundo que passo sem você é uma descompassada tristeza, preciso de você a todo momento, se respiro é por um único motivo, porque te amo...você é minha vida e...sem você tudo é apenas um dia cinza e chuvoso” deixando cair uma lágrima, continuei: “Agradeço por estar em minha vida”.
Ela me olhava com tanta ternura que roubou de mim mais um sorriso de alma, ela se mostrava como uma divindade, talvez seria alguma deusa que fugia do Olimpo e viera me amar por piedade. Fechei os olhos e senti seu perfume, que não era perfume de frascos, mas sim perfume de espírito.
Ao abrir os olhos, quase cai por me desequilibrar...ela não estava mais ali...
Ela esteve ali?
Olhei desesperadamente pela rua, liguei o carro e a procurei, mas não existia sinal da minha garota por parte alguma. Desviei o olhar para um ponto qualquer do céu que ainda muito nublado conseguia me ceder uma pequena estrela, olhei a com a curiosidade de uma criança e deixei escapar umas palavras: “ é, olha o que ela me faz, mas sabe...é isso que me faz ter certeza que é ela a mulher da minha vida...e a cada dia, a cada minuto que a saudade aperta mais e mais, o meu amor fica mais forte...eu a amo e obrigada, Deus, por isso".

(continua...)

By Camila Passatuto

domingo, 14 de setembro de 2008

Je t'aime

Eu sempre vivia escrevendo pelas paredes da cidade, nos bancos da praça, nas folhas amassadas, em um avental velho, no caderno esquecido, em uma sulfite intocável...Os temas, sempre os mesmos, descontentes, desavisados, puros e ao mesmo tempo se limitavam às minhas crises de angústia.
Hoje não escrevo...Os temas não existem em meu dia-a-dia, e se existem eu os ignoro como se esses fossem uma vespa chata que perturba o sono do pobre mendigo sonolento...
Hoje minhas palavras têm direção, evocam um nome, despertam uma princesa, alimentam um sorriso, declaram uma saudade, glorificam um instante...
E se eu fosse parafrasear meus sentimentos, colocaria a menina de meus sonhos diante do papel. E se eu fosse rimar...e se eu fosse repetir...e se eu fosse explicar, colocaria o seu suor sobre as folhas e ali estaria a arte que iria me satisfazer por inteira.
Eu sempre vivia escrevendo pelas paredes da cidade, hoje eu vivo ensaiando frases para te encantar...roubando momentos do Senhor Tempo para poder estar um instante eterno ao seu lado...hoje eu vivo cantarolando seu nome, desenhando em mim suas promessas, edificando no espaço nossos planos, apagando minhas velhas escritas, escrevendo nosso novo caminho.
Talvez eu seja uma pseudoalgumacoisa, talvez eu não seja nada...mas quando posso ouvir sua voz, entender seus medos, despertar em você um tímido desejo é nesses momentos que me torno alguém no mundo.
E eu sempre vivia escrevendo pelas paredes da cidade, eu era sozinha, eu sentia frio e hoje você me acompanha pelos trilhos, insere em mim um calor que a principio eu desconhecia...hoje eu sei, eu conheço, eu entendo...isso tudo é apenas um verbete de quatro letras, para os infelizes, mas para mim isso é tudo...isso é o que nos move...isso é o nosso eterno amor.Te amo.



By Camila Passatuto